sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Te amo, te amo, te amo...

Era madrugada ainda. O Mitsubishi Lancer estacionado no rico condomínio Rancho das Margaridas tinha duas de suas quatro portas abertas.

- Preciso pegar a bolsa lá em cima. - Mariana Conte falou de si para si enquanto pensava que aquela era a primeira viagem com César, seu noivo. Mariana amava César. Estava distraída com seus pensamentos e foi quando se deu conta que faltava uma bolsa.

Mariana subiu as escadas até o quarto, pegou a bolsa em cima da cama e sentiu o mundo girar ao seu redor. Começou como uma tontura e uma dor de cabeça lhe subiu de trás, da nuca, até a testa. A dor era tão forte que parecia lhe triturar o cérebro. Paralisou de dor e lágrimas encheram-lhe os olhos. Ela teve tempo apenas de sentar na cama. Trêmula e parecendo em transe, suas mãos apertavam a cabeça, até que Mariana desabou no chão do quarto. A sua empregada já estava acordada e, atraída pelo barulho, correu até o local e viu a patroa desfalecida. Não conteve um grito de horror que acordou toda a vizinhança. Eram 5h10 da manhã, uma sexta-feira. Mariana foi levada ao hospital. César foi avisado e correu pra lá.

Depois de um ano de namoro, César entendeu que estava na hora de tomar uma decisão, assumir um compromisso sério. Mariana Conte é advogada, vem de uma família de ricos advogados, teve uma vida abastada com viagens anuais ao exterior. Sua pós-graduação foi em Berlim, onde viveu por três anos. Já ele não poderia ter tido origem mais humilde. Seu pai foi estivador na juventude, depois arrumou emprego num barco de pesca onde permaneceu por trinta anos até se aposentar. Passava mais tempo no mar que em casa. Sua mãe criou os quatro filhos praticamente sozinha. Viviam com dinheiro contado e luxo zero. Com muito custo, César estudou, formou-se em Ciência da Computação.

Naquela manhã, no hospital, ouviu do médico que Mariana tinha uma doença rara, pouquíssimo conhecida. Era um distúrbio que causava um tipo de blackout no organismo. O corpo atingido simplesmente apagava, paralisava todas as funções vitais por tempo suficiente para causar-lhe desfalecimento. Até onde se sabia, não tinha cura. O médico disse que usaria um tratamento para reduzir os sintomas: tontura, forte dor de cabeça e confusão mental.

Apesar da triste notícia, o casamento foi realizado meses depois. A doença avançou e Mariana foi acometida cada vez mais pelos apagões. Foi levada aos melhores médicos do mundo que não conseguiam resolver o problema. Morreu antes dos 30 anos. César, ainda jovem, não passou um único dia do resto de sua vida sem lembrar o rosto e o lindo sorriso de sua mulher. Ele estava 30 milhões de reais mais rico desde que casara com Mariana. E foi esse o valor da quantia que ele doou a uma instituição que pesquisa doenças raras como a de Mariana e ajuda os doentes e seus familiares.

Alguns anos depois que perdeu a esposa, César mudou-se para o litoral. Todas as noites ele sonha com sua mulher e em todas as ocasiões ela lhe repete no sonho: te amo, te amo, te amo... Ele nunca teve coragem de casar outra vez.


(Dezembro 2008)

Nenhum comentário:

Postar um comentário